Máfias farmacêuticas ampliam ofensiva contra genéricos

Por Ignacio Ramonet
Diretor do Le Monde Diplomatique


No comércio de medicamentos, a competição não funciona e os grandes grupos farmacêuticos recorrem a todo tipo de jogo sujo para impedir a chegada ao mercado de medicamentos mais eficazes e, sobretudo, para desqualificar os genéricos, muito mais baratos.
Consequência: o atraso no acesso do consumidor aos genéricos traduz-se em importantes perdas financeiras, não apenas para os próprios pacientes, mas para a Saúde  Pública a cargo do Estado (ou seja, paga pelos contribuintes).
Isto também oferece argumentos aos defensores da privatização dos Sistemas Públicos de Saúde, acusados de serem fossos de défices no orçamento dos Estados.
Os genéricos são medicamentos idênticos - quanto aos princípios ativos, dosagem, fórmula farmacêutica, segurança e eficácia - aos medicamentos originais produzidos com exclusividade pelos grandes monopólios.
O período de exclusividade e proteção da patente do remédio original vence após uma dezena de anos, quando então outros fabricantes têm direito de produzir os genéricos, que custam cerca de 40% mais barato.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a maioria dos governos recomendam o uso de genéricos porque, por seu menor custo, favorecem o acesso equitativo à saúde das populações expostas a doenças evitáveis2.
O objetivo dos grandes laboratórios consiste, por conseguinte, em retardar, por todos os meios possíveis, a data de vencimento do período de proteção da patente.
O mercado mundial de medicamentos representa cerca de 700 bilhões de euros; e uma dezena de empresas gigantescas, entre elas as chamadas "Big Pharma" - Bayer, GlaxoSmithKline (GSK), Merk, Novartis, Pfizer, Roche, Sanofi-Aventis -, controlam metade desse mercado.
Os seus lucros são superiores aos obtidos pelos poderosos grupos do complexo militar-industrial. Para cada euro investido na fabricação de um medicamento de marca, os monopólios ganham mil no mercado.
Além disso, três dessas companhias (GSK, Novartis e Sanofi) pretendem ganhar bilhões de euros mais nos próximos meses graças à venda maciça da vacina contra o vírus A (H1N1) da nova gripe.
Essas gigantescas massas de dinheiro dão às Big Pharma potência financeira absolutamente colossal, que usam particularmente para arruinar, mediante múltiplos julgamentos milionários perante os tribunais, modestos fabricantes de genéricos.
Os seus numerosos lobbies fustigam permanentemente o Escritório Europeu de Patentes (OEP), cuja sede fica em Munique, para retardar a concessão de autorizações de entrada de genéricos no mercado.
Além disso, realizam campanhas enganosas sobre esses remédios bioequivalentes e assustam os pacientes.
O resultado é que, segundo o recente Informe divulgado pela Comissão Europeia, os cidadãos têm de esperar, em média, sete meses mais do que o normal para ter acesso aos genéricos, o que se traduziu, nos últimos cinco anos, em gasto extra desnecessário de aproximadamente 3 bilhões de euros para os consumidores e em 20% de aumento para os Sistemas Públicos de Saúde.
A ofensiva dos monopólios farmacêutico-industriais não tem fronteiras.

Também estariam implicados no recente golpe de Estado contra o presidente Manuel Zelaya em Honduras, país que importa todos os seus medicamentos, produzidos fundamentalmente pelas "Big Parma". 
Desde que Honduras entrou para a Aliança Bolivariana para os Povos da América (Alba), em agosto de 2008, Zelaya negociava acordo comercial com Havana para importar genéricos cubanos, com a intenção de reduzir os gastos de funcionamento dos hospitais públicos de seu país.
Barack Obama, desejoso de reformar o sistema de saúde dos Estados Unidos, que deixa sem cobertura médica 47 milhões de cidadãos, enfrenta a ira do complexo farmacêutico-industrial.
Nos EUA, as quantias em jogo são gigantescas (os gastos com saúde representam o equivalente a 18% do PIB) e controladas por vigoroso lóbi de interesses privados que reúne, além das Big Pharma, as grandes companhias de seguro e todo o sector de clínicas e hospitais privados.
Nenhum desses atores quer perder os seus opulentos privilégios. 

Por isso, apoiando-se nos grandes meios de comunicação mais conservadores e no Partido Republicano, investem pesado em campanhas de desinformação e de calúnias contra a necessária reforma do sistema de saúde.
É batalha crucial. 

E seria dramático ver as máfias farmacêuticas ganharem. Porque então redobrariam os esforços para atacar, na Europa e no resto do mundo, o avanço dos medicamentos genéricos e a esperança de alguns sistemas de saúde menos caros e mais solidários.

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