As transformações sociais em curso na América Latina, especialmente na Venezuela, ameaçam os grupos que sempre tiveram privilégios insustentáveis. São os mesmos que se apropriam das riquezas naturais e impõem à população modelo de “desenvolvimento” que degrada de forma irreversível o meio ambiente e provoca o esgarçamento do tecido social, fazendo da sociedade palco de violência sem precedentes
Frei Gilvander Luís Moreira
Mestre em Exegese Bíblica e assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina
gilvander@igrejadocarmo.com.br
Delze dos Santos Laureano
Professora de Direito Constitucional e Direito Agrário, membro da RENAP – Rede Nacional de Advogados Populares
delzesantos@hotmail.com
José Luiz Quadros de Magalhães
Professor de Direito Constitucional da UFMG
ceede@uol.com.br
O medo dos grupos que sempre tiveram privilégios insustentáveis agrava-se com a possibilidade concreta de a Venezuela passar a integrar o Mercosul.
Por isso, fomenta-se no Brasil processo de satanização de Hugo Chávez e da Revolução bolivariana.
A mídia, através da Revista Veja, da TV Globo e cia, procura, de forma orquestrada, macular o processo de libertação ora em curso na Venezuela e na Bolívia.
Tenta impedir a construção de outra forma de organização política fora da “democracia” liberal hegemônica, esta que pretende ser a vitória do capitalismo sobre o socialismo real, pós-esfacelamento do leste europeu e que teve a pretensão de determinar o “fim da história”.
Estivemos em Caracas, na Venezuela, durante dez dias, no Sexto Fórum Social Mundial.
Mantemos comunicação com várias pessoas amigas de lá.
Diante da enxurrada de calúnia que a mídia propala impiedosamente contra Hugo Chávez, cabe recordar várias coisas que estão acontecendo na Venezuela.
Grande mutirão pela educação acabou com o analfabetismo naquele país.
O povo controla e comercializa o petróleo, grande riqueza natural que agora serve para melhorar a vida das pessoas e não mais aumentar o lucro das multinacionais.
O povo venezuelano está cheio de esperança; a juventude, em sua maioria esclarecida, está comprometida com a organização popular, com a construção de uma democracia verdadeiramente participativa.
As críticas internas a Hugo Chávez vêm dos canais de TV que estão nas mãos das elites e da minoria privilegiada.
A população pobre é beneficiada com preços de 30% a 50% mais baixos do que nos mercados privados nos milhares de Mercados Populares (Mercal), que alimentam a maioria da população.
Os estudantes que lideram os movimentos por “liberdade” são os de classe média alta, defensores dos ideais de liberdade como privilégio para poucos, mesmo quando o sistema que mantém essa chamada “liberdade” condena à miséria e à exclusão a maioria da população.
Na Venezuela bolivariana, todos os estudantes que cursam universidades públicas, ou que ganham bolsas de estudos, diferentemente do que acontece no Brasil, prestam serviço social à comunidade.
Dão contrapartida para a sociedade em vista dos recursos públicos que recebem para estudar.
Só na Universidade Bolivariana mais de 500 mil jovens pobres estão estudando.
O governo de Hugo Chávez apóia a instalação, regulamentação e funcionamento de rádios comunitárias.
Não há burocracia para conseguir a documentação e o governo ajuda financeiramente na compra dos equipamentos para se fortalecer a comunicação alternativa e mais interativa.
Assim, não procedem as alegações de que não há liberdade de imprensa na Venezuela.
O governo venezuelano não tem o monopólio da informação. Contrariamente investe contra o monopólio dos meios de comunicação, como o que ocorre hoje no Brasil, onde poucas famílias controlam o sistema de informação de massa.
Na Venezuela, atualmente, existem mais de 20 mil médicos cubanos, que, com apenas ajuda de custo de um salário-mínimo, estão alavancando revolução no sistema público de saúde.
São responsáveis pelo atendimento primário da população, algo parecido com o médico de família.
Estão nas favelas e bairros pobres; lá vivem e atendem aos pobres, com competência e dedicação.
"Por mais de 50 anos os médicos venezuelanos recém formados se recusaram a ir para o interior, para os bairros, para a periferia. Só queriam ficar na capital, ganhar dinheiro às custas da dor. Agora, com Chávez, eles tiveram sua chance de ajudar o povo. Não quiseram. Então foi preciso apelar para a solidariedade. Vieram os médicos de Cuba e estamos tendo acesso à saúde nos lugares mais distantes e pobres”, informa um jovem da periferia de Caracas.
Yojin Ramones, venezuelano que vive no Brasil, referenda nossa percepção, revelando que na Venezuela há recuperação acelerada da atividade econômica, melhorando o poder aquisitivo de todos. Isso mesmo, de todos – os venezuelanos, ricos e pobres (antes eram apenas os ricos).
O país tem anualmente o crescimento do PIB (Produto Interno bruto) mais elevado da América Latina, cerca de 10% nos últimos anos.
Lá são convocados referendos sobre os temas mais importantes do país, de modo que o povo opine e escolha o que quiser.
Os abusos dos bancos foram freados pelo governo.
Por exemplo, a taxa de juro anual de cartão de crédito é de 28% ao ano; aqui no Brasil é acima de 120% ao ano.
Não há país da América Latina que tenha feito tantas obras – como metrôs, pontes, teleférico, aeroportos – em apenas oito anos.
Os serviços de saúde devolveram a vista a milhares de pessoas carentes de recursos, não só venezuelanos, mas latino-americanos.
Pela primeira vez, muitos bairros pobres têm médico para dar atenção às pessoas.
A integração da América do Sul é prioridade para o fortalecimento de nossas raízes e forças latino-americanas.
Quanto à democracia é importante lembrar que o Hugo Chávez, assim como os partidos políticos que o apóiam, venceu todas as eleições que foram supervisionadas por organismos internacionais e políticos de todo o mundo, inclusive um ex-presidente norte-americano (Jimmy Carter).
Todos atestaram a lisura dos pleitos.
Importante acrescentar que as eleições ocorreram com a grande maioria dos meios de comunicação (jornais, rádios e TV) em franca campanha de difamação contra o governo de Hugo Chávez.
Em qualquer parte do mundo, os responsáveis pelas emissoras de rádio e TV, teriam sua concessão cassada, e em alguns países seriam processados por calúnia e difamação, como, por exemplo, nos EUA e na França.
A reforma da Constituição, ora em curso, faz parte de processo de mudança estrutural radical, que pode transformar a Venezuela em sociedade sem miséria, sem exploração e sem exploração, fundada na solidariedade e não na competição, no egoísmo e na ganância.
Para além dos mecanismos de democracia representativa, o povo da Venezuela tem mostrado grande capacidade de mobilização e participação, construindo democracia participativa que legitima as transformações em curso.
Nós devemos ficar sempre atentos para que o caminho democrático participativo construído na América latina hoje não seja desviado por projetos pessoais.
Toda mudança só é legitima se construída democraticamente pelo povo.
Nesta esteira é que temos de defender aguerridamente os povos e os projetos transformadores de Cuba, Venezuela, Bolívia e Equador.
Primeiro, porque sãos povos que estão em processo de libertação, lutam com destemor contra o imperialismo e a opressão capitalista neoliberal.
Segundo, porque se estes países forem sufocados, teremos que viver mais tempo com os valores da indiferença pelo ser humano que hoje domina as sociedades e ameaça o planeta.
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