EUA voltam-se à América do Sul, pelas portas do fundo, como sempre

A visita, em março próximo, do presidente americano, George W. Bush, ao Brasil já é motivo de controvérsia e mostra que o governo dos EUA tenta aproximar-se da América do Sul, mas de forma ardilosa e mentirosa, entrando pelas portas do fundo.
O subsecretário para Assuntos Políticos dos EUA, Nicholas Burns, antes de embarcar para o Brasil, a fim de iniciar os preparativos da viagem de Bush, mentiu ao dizer que a delegação americana não pretendia discutir as política interna e externa da Venezuela com as autoridades brasileiras.
Em Brasília, Burns reuniu-se com o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, e a Venezuela, segundo Amorim, foi tema da agenda.
O ministro disse que expressou a Burns a negativa sobre a possibilidade de o Brasil participar de qualquer iniciativa do governo Bush no sentido de conter a política do governo do presidente venezuelano Hugo Chávez.
"O Brasil não fica passando recado. Eles têm embaixador lá. Há formas de diálogo sem necessidade de que o Brasil se arvore como mediador", disse Amorim.
Segundo o ministro, Burns ouviu dele que a política de isolamento não dá resultado: "o que sempre digo, e ele não discordou, é que a boa política é a do diálogo, mas claro que é preciso que os dois queiram dialogar".
Os preparativos da viagem do Bush envolvem outra visita polêmica ao Brasil: a do procurador-geral dos EUA, Alberto Gonzáles, que desembarcou em Brasília depois de Burns, após passar pela Argentina.
Gonzáles ficou conhecido por elaborar, em 2002, interpretação peculiar dos termos da Convenção de Genebra.
Por um lado, defendeu que Convenção de Genebra garanta a proteção aos militares norte-americanos no exterior; por outro lado, relativizou a definição de tortura contra prisioneiros capturados em conflitos considerados como parte da guerra dos EUA contra o terrorismo.
Para Gonzáles, a Convenção de Genebra não valia para os “inimigos combatentes”, expressão pela qual o governo dos EUA passou a designar os homens da Al Qaeda e os talibãs do Afeganistão.
A partir de memorando secreto elaborado por Gonzáles, só seria considerada tortura a prática na qual a dor gerada nos interrogatórios incluísse “feridas que produzam a morte, a falência de um órgão ou sérios impedimentos de uma função corporal”; ou seja, tortura mas não mata.
Foi assim que os militares dos EUA, nas prisões de Guantánamo e Abu Ghraib tiveram sinal verde para golpear prisioneiros das mais variadas formas, promover humilhações sexuais, amedrontrar presos com cães e outras práticas consideradas cruéis e desumanas pela Cruz Vermelha Internacional.
Em Brasília, Gonzáles reuniu-se com governadores e com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos; no Rio, teve encontro-almoço com empresários.
Por ocasião de sua nomeação para o Departamento de Justiça dos EUA, a Anistia Internacional e outras organizações não-governamentais criticaram duramente Gonzáles, em carta aberta, publicada no jornal The New York Times.
“Pode ser que vocês não conheçam Alberto Gonzáles”, dizia a carta, “mas estamos certos de que reconhecerão os resultados de seu trabalho”.
Ao lado do texto, aparecia uma das fotos dos abusos cometidos contra prisioneiros iraquianos na prisão de Abu Ghraib.
A visita de Gonzáles à Argentina foi repudiada.
O jornal argentino Página 12 destacou que ele, considerado o ideólogo das torturas, “é algo assim como o alter ego judicial de George Bush”.
Segundo o Página 12, Gonzáles foi acusado pela União Norte-americana para as Liberdades Civis e pelo Centro para Direitos Constitucionais de interpretar as leis para a conveniência de Bush. Essa atitude, disse o jornal, converteu-se em dolorosa certeza em escala mundial a partir de 2000, quando George W. Bush chegou à Casa Branca.
A passagem de Gonzáles pela Argentina foi alvo de protesto por parte das Mães da Praça de Maio: “Repudiamos energicamente a visita ao país do procurador geral dos Estados Unidos, Alberto Gonzáles, impulsionador da tortura e de outros métodos criminais naquilo que Bush denomina guerra contra o terrorismo. Envergonha-nos que um sinistro personagem pise no solo argentino, onde milhares de pessoas foram vítimas desses métodos criminais. A visita deste delegado da morte ofende ao povo, ainda mais no momento em que a Argentina está empenhada no resgate da memória, da verdade e da justiça, e acaba de firmar uma Convenção Internacional sobre a Desaparição Forçada de Pessoas como crime contra a humanidade”.
O governo Bush, que é responsável pela morte de milhares e milhares de inocentes no Oriente Médio, que tem tropas em bases militares nos quatro cantos do mundo e que tenta consolidar poder global pelo imperialismo, belicismo e domínio da economia, da tecnologia e da mídia, volta-se, neste momento, para a América do Sul, mas entrando pelas portas do fundo, mentindo e difarçando-se, como tem feito ao longo das décadas para manter-se hegemônico na região.

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