20 grupos, entre eles 14 estrangeiros, controlam o agronegócio brasileiro

O economista João Pedro Stedile (foto), um dos fundadores e principal dirigente do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), afirma que há vários segmentos que se constituem em oligopólios no agronegócio do Brasil: fertilizantes, venenos agrícolas, máquinas e equipamentos, no comércio etc.
"Por exemplo, somos os maiores produtores de soja mundial enquanto território, mas quem controla a soja no Brasil são a Bunge, Monsanto, Cargill, Dreyfus e a ADM do Brasil. Elas ficam com a maior parte da margem de lucro. A burguesia agrária brasileira - essa que se diz representante do agronegócio - não tem consciência de classe para si. Se tivesse, teria que se unir com os camponeses e os trabalhadores agrícolas, para, juntos, enfrentarmos essa espoliação feita pelas transnacionais".
Stédile deu longa entrevista ao ex-ministro e ex-deputado José Dirceu, dirigente do PT. A íntegra entrevista, da qual destacamos trechos, está no site Zé Dirceu - espaço para discussão do Brasil. http://www.zedirceu.com.br/

 
Trechos da entrevista: 


O
ligopolização da agricultura brasileira
O agronegócio brasileiro conta com 300 mil fazendas com mais de 200 hectares e com 15 mil latifundiários que detém fazendas acima de 2,5 mil hectares e possuem 98 milhões de hectares.
Esse é o conjunto do agronegócio que produz R$ 90 bilhões do PIB agrícola no país.
Se você olhar para quem eles vendem, descobrirá que 20 empresas, hoje, controlam todo o comércio agrícola brasileiro, tanto o de insumos (para financiar a produção), quanto o de commodities.
Dessas 20 empresas, 70% são transnacionais e o PIB delas – segundo o Valor Econômico - atinge R$ 112 bilhões a R$ 115 bilhões.
Claro que tem a margem de lucro.
Mas podemos perceber o movimento do capital.
Toda a produção do agronegócio é concentrada por 20 empresas que acumulam essa riqueza que vem da natureza.
Nisso destaca-se, também, o movimento do capital que levou à maior oligopolização da agricultura.

América Latina e EUA
Estamos vindo de dez anos de avanços das forças progressistas na América Latina, mas este avanço, registrado a partir de 1999, com a subida do presidente Hugo Chávez (Venezuela), até hoje, não veio acompanhado com o reacenso do movimento de massas.
Talvez, na Bolívia aconteceu, mas nos demais países não.
Isso criou dificuldade maior.
O império norte-americano, ao se dar conta de que as massas não vieram para o reacenso, para participar mais da atividade, evidentemente, está tentando reestaurar o seu projeto para a América Latina .
Os EUA tinham sido derrotados nesses dez anos.
Foram derrotados quando tentaram impor a Aliança para o Livre Comércio para as Américas (ALCA) e agora tentam recompor esse projeto, que inclusive, independe da postura pessoal do presidente Barack Obama.
O projeto do império é o do capital imperialista, do Estado belicista norte-americano.
Há alguns dias, ouvi palestra na qual o orador dizia que toda a tentativa da economia norte-americana de sair da crise é aumentando a indústria bélica.
Nem é pela saúde, nem por um Bolsa Família, eles poderiam criar uma bolsa família para os pobres norte-americanos e incentivar o mercado interno ou frear as importações da China.
Não.
A alternativa principal que o capital americano está tomando para sair da crise é o aumento da sua produção bélica e com isso, ter mais armas e munição.
Isso é um perigo, porque eles vão estimular conflitos até para reativar sua economia.
Nesse cenário, nós vemos os EUA acelerando, mudando o passo.
O caso de Honduras, por exemplo, todos sabemos qu e a base americana se envolveu, o embaixador se envolveu.
No Panamá, idem. Essas bases da Colômbia (seis norte-americanas) são uma ofensa a todo o continente, um caso inadmissível.
Nessa questão concordamos com a avaliação do Chávez, de que é tentativa de transformar a Colômbia em Israel na América do Sul.
Sobretudo tentativa de levar a guerra fria entre a Colômbia e a Venezuela.
É o pior dos mundos porque obriga a Venezuela a gastar dinheiro público em armamento, tanque e helicóptero ao invés de comprar casa e construir metrô.
Então, estimula-se guerra fria regional para barrar o processo venezuelano.
Pelo que se vê pelo Chile e o Peru, trata-se de reativar as direitonas locais para tentar retomar o controle.
Não se sabe até que ponto essa mesma direita norte-americana vai insuflar nossas eleições dde 2010.
É possível que isso ocorra aqui no Brasil.
Com isso, o tom ideológico aumenta.

CPI do MST
Vemos de duas formas a CPI do MST, instalada no Congresso.
Primeiro, dentro do contexto maior da luta de classes no Brasil: parte daquela parcela da direita parlamentar brasileira, encrustrada lá no parlamento, que vive querendo criar factóides para antecipar a disputa eleitoral.
Como o próprio deputado Ronaldo Caiado (DEM-GO) revelou, o principal objetivo da CPI do MST é provar que o governo vai destinar dinheiro para o MST para fazer campanha para a (ministra) Dilma Rousseff.
Isso é ridículo!
Mas, ele falou isso na tribuna.
Revela, então, as motivações ideológicas desta direita, ou seja, criar factóides para fazer disputa eleitoral e política besta.
Um segundo aspecto na análise dessa CPI, aqui mais da luta de classes, é que eles quiseram peitar o governo quando fizemos essa parceria na portaria para mudar os índices de produtividade.
Estes índices precisam ser atualizados por força de lei.
A lei agrária determina – a de 1993 – que os índices tinham que ser atualizados a cada dez anos.
E os índices atuais que o INCRA usa são de 1975.
Uma piada.

A direita quis dar o troco contra o governo, não contra nós, para criar constrangimento, jogo de troca aí.
Tudo contra a possibilidade de atualizar o índice de produtividade.
Então se começa a CPI em palanque ideológico contra nós.
Evidentemente, sempre que instalam CPI fazem o que querem.
Todas as entidades que estão eles estão dizendo que tem problemas já foram investigadas pela CPI da s ONGs e tiveram sigilo quebrado.
Como se diz no interior, eles estão criando chifres em cabeça de mula.
Mas esse é o papel da direitona que quer proteger os seus privilégios.

Ação em área grilada ocupada pelo Grupo Cutrale
A Cutrale, que tem mais de 30 fazendas em São Paulo, somando mais de 50 mil hectares, está em dívida com a Justiça Federal.
Aquela área foi comprada de um grilo e eles sabiam.
Eles partiram para o risco de comprar área grilada, contando com as influências políticas que tem na República do Brasil.
Como estão acostumados com o monopólio da laranja, encheram de laranja para consolidar que a área era produtiva. Mas toda aquela área onde houve a ocupação - nem é só da Cutrale - é o chamado grande grilo (terras griladas) do Monção.
A origem desse grilo é de terras que a União comprou em 1910 - portanto houve dinheiro público na compra da área original – para um projeto de colonização para famílias japonesas que não deu certo.
Então, as terras foram ficando e houve esse grilo.
A ocupação feita agora pelos sem-terra tinha a vontade política, o objetivo de fazer essa denúncia. Nisso a ocupação foi eficaz.

Agora, o fato de terem derrubado laranjais foi erro dos companheiros que estavam lá. Estamos no meio da briga, entendemos o desespero das famílias que estão há cinco anos querendo ter a terra e sabem que essa terra é grilada.
O INCRA mesmo disse: “essa terra é da União”.
Então o cara, o sem-terra chega na fazenda e quer plantar feijão.
Evidentemente, a direita soube explorar muito bem esse fato, a partir de um erro nosso.
As imagens de TV foram feitas no dia 28/09.

A direita, articulada no Congresso, esperou o dia certo para fazer a superexposição na mídia.
Aquilo não foi reportagem sobre a ocupação, apresentada no dia em que ela ocorreu.
O ato foi filmado pelo serviço secreto da PM.

Outro aspecto: todas as outras imagens de depredação de trator, invasão das casas dos funcionários são mentira.
Aquilo é manipulação.
Desafiamos publicamente a constituirem comissão independente - e com o Ministério Público - e a irem lá e fazer a perícia para descobrir desde quando esses tratores estão desmontados. Isso é muito fácil de verificar.
Que a comissão pergunte para as famílias (de empregados do grupo Cutrale) se algum sem-terra entrou na casa deles.

Mas houve o erro, evidentemente.
Com esse erro, a burguesia da elite econômica, que tem o monopólio da comunicação, está explorando o assunto.
E nós estamos pagando caro, porque com isso, criaram o sentimento que levou ao recolhimento e obtenção das assinaturas para a CPI.


Eleição de 2010
Não temos feito debate mais eleitoral, em relação a 2010, e estamos tendo cuidado com isto.
O nosso debate interno ainda é sobre a política geral, a luta de classes e a correlação de forças.
Em termos gerais, te respondo pelo que é da tradição da nossa política: primeiro, manter nossa autonomia; segundo, continuar nosso trabalho político e ideológico de estimular – e é assim que nossa militância se comporta – o eleitor a sempre votar tanto em nível federal, quanto estadual, quanto municpal, nos candidatos mais progressistas e que defendem a reforma agrária; terceiro, há vontade e decisão política de barrar a volta do neoliberalismo.
Estamos e somos contra os projetos de restauração do neoliberalismo.
Sem dúvida, o MST estará nas primeiras trincheiras da batalha.
Fazemos questão de ajudar a contribuir para que o neoliberalismo não se restaure aqui no Brasil.
Os jornalistas perguntam: “vocês são da Marina, da Dilma, do Ciro etc”, o que respondemos é que não nos cabe discutir nomes agora.
O que temos que estimular na sociedade brasileira é a discussão de um projeto para que ao redor dele as pessoas votem com consciência.
Nós não caímos nos simplismo de vontades eleitorais, ou partidárias, ou por afinidades pessoais. Tem gente que diz: "pessoalmente a Dilma é muito parecida com o Ciro... " Isso não explica nada! Então, até para não cair nesse tipo de reducionismo, nós achamos que o debate político a ser feito daqui a até outubro do ano que vem tem que ser sobre a necessidade de um projeto para o país, para que as pessoas saibam o que está em jogo e que tipo de projeto nós temos que fazer avançar daqui para a frente. Esse é o debate que estamos fazendo entre nós.
Evidentemente, que no caso do Rio Grande do Sul, a batalha será mais dura, porque por todo o uso que fez da Brigada Militar e do ministério publico estadual, o projeto da Yeda (Crusius) foi não só o da restauração do neoliberalismo, mas dos fascistas.
Depende de cada Estado, o maior ou menor engajamento da militância. E isso se dará, também, em função das candidatu ras estaduais.
Os governadores tem muito peso nas lutas sóciais do campo, já que quem nos reprime são as polícias estaduais.

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