Governo do Peru promove massacre de índios em defesa de investimentos de multinacionais

Helicópteros foram utilizados na repressão popular em campo aberto

Dezenas de indígenas da Amazônia morrem em luta contra o Estado e as petrolíferas; conflito ilustra problema que se tornou crucial na América Latina: a exploração do subsolo e a devastação do meio ambiente em detrimento aos povos autóctones e à biodiversidade

Por Yvon Le Bot
Diretor do Centro Nacional de Pesquisa Científica (França) e Jean-Patrick Razon, diretor da Survival International (França), movimento mundial de apoio aos povos indígenas


Ordem de despejo executada, no dia 5, pelo Exército e pela polícia do Peru, em estrada na região norte do país, deixou dezenas de indígenas amazônicos mortos e pelo menos 150 feridos.

Os números reais do confronto são incertos: o governo de Alan García fala em pelo menos 11 policiais mortos e apenas 9 civis; já a principal entidade indígena do país, a Associação Interétnica de Desenvolvimento da Selva Peruana (Aidesep), afirma que no mínimo 25 nativos foram assassinados, mas que o número pode chegar a 40.
A entidade e outras organizações não-governamentais acusam a polícia peruana de estar ocultando cadáveres, a fim de diminuir a contagem de mortos.
Esses enfrentamentos são resultado de conflito por conta da exploração das riquezas petroleiras.
Imensas reservas foram descobertas nos últimos anos na região.
Um milagre, segundo o presidente Garcia, que multiplica as iniciativas favoráveis à exploração petrolífera por empresas estrangeiras, incluindo a Perenco, grupo franco-britânico.

Isso tem conseqüências trágicas para as comunidades de caçadores-coletores que extraem seus recursos da floresta e dos lençóis d’água.

Os indígenas agrupados na Associação Interétnica para o Desenvolvimento da Selva Peruana mobilizaram-se contra a destruição e a contaminação de seu espaço vital e, depois de várias semanas, a tensão não termina.
Eles já receberam apoio de numerosos setores da população de todo o território nacional.
Antes dos acontecimentos dos últimos dias, mobilização geral havia sido programada para a quinta-feira, 11 de junho.

O governo manifestou sua vontade de passar por cima a todo custo, de abrir caminho às companhias, ignorando os direitos reconhecidos às comunidades desde os anos 70 (por parte do governo militar progressista de Juan Velasco Alvarado), protegidos pelas convenções da ONU.

O que acontece no Peru é ilustração dramática de problema que se tornou crucial em toda a América Latina: a exploração do subsolo e a devastação do meio ambiente em detrimento aos povos autóctones e à biodiversidade.
No Brasil, Chile, Colômbia, Guatemala, os grupos indígenas se opõem às empresas de exploração de recursos petroleiros, minerais ou florestais.
No Equador, as comunidades amazônicas abriram processo contra a empresa transnacional Texaco, que provocou verdadeiro desastre ecológico em vasta região.
Nunca se havia visto as comunidades amazônicas tentarem mover processo contra grande multinacional e menos ainda que os tribunais se mostrassem sensíveis aos seus argumentos.

Vários governos latino-americanos tomaram dimensão do problema e se esforçam para avançar para soluções negociadas.
Esse é o caso da Bolívia, onde o presidente indígena Evo Morales nacionalizou as reservas de hidrocarbonetos e renegociou com as empresas estrangeiras as condições de exploração, a fim de assegurar redistribuição mais equitativa dos benefícios, notoriamente por meio de programas de desenvolvimento, educação e saúde para as populações necessitadas.
O presidente equatoriano, Rafael Correa, propôs, no entanto, congelar a exploração de região inteira da Amazônia por razões ecológicas e em troca de contrapartidas financeiras da parte da comunidade internacional.
No Brasil, decisão recente da mais alta corte de justiça veio a confirmar ordem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que reconhece imenso território dos grupos indígenas no norte da Amazônia, freando, assim, a penetração de caçadores de ouro ou traficantes de madeira (no total, 13% da superfície brasileira está constituída como território indígena).
Os movimentos indígenas que se desenvolveram na América Latina nas últimas décadas conquistaram avanços importantes em nome dos seus países e incluíram o reconhecimento dos direitos territoriais.
Mesmo assim, o subsolo permanece como propriedade da nação e, na maioria das vezes, sua exploração é confiada a companhias nacionais ou multinacionais que pilham e saqueiam sem consideração aos ocupantes e nem ao meio ambiente.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Buscar neste site: