Crescem as pressões para investigação de crimes do governo Bush

Pesquisa do Instituto Gallup mostra que dois terços dos norte-americanos são a favor de investigação oficial sobre os crimes cometidos na era Bush. Do total, 38% querem investigação penal e 25% pedem comissão independente

Por William Fisher
Da Inter Press Sservice


Cada vez mais norte-americanos reclamam investigação oficial dos crimes que o governo do ex-presidente George W. Bush possa ter cometido em sua “guerra contra o terrorismo”.
Para o presidente Barack Obama "ninguém está acima da lei e, se há indícios claros de faltas, essa gente deve ser julgada como qualquer cidadão comum".
O procurador-geral de Obama, Eric Holder (foto), fala a respeito da eventualidade de julgamentos: “o governo Bush autorizou o uso da tortura, aprovou a vigilância eletrônica secreta contra cidadãos norte-americanos, deteve em segredo cidadãos norte-americanos sem o devido processo legal, negou habeas corpus a centenas de acusados de serem combatentes inimigos e autorizou os procedimentos que violam tanto o direito internacional quanto a Constituição dos Estados Unidos", afirmou.
A pesquisa do Instituto Gallup mostrando que o povo dos EUA quer a investigação e punição de eventuais culpados foi realizada na terceira semana de fevereiro.
Em cima dos dados do Gallup, o presidente do Comitê Judiciário do Senado, o democrata Patrick Leahy, quer formar comissão, que ele chamou de “comissão da verdade semelhante às criadas após o apartheid na África do Sul ou no fim de ditaduras na América Latina para apurar os fatos".

Essa comissão investigaria abusos contra presos e outros mecanismos que tenham violado os direitos humanos inspirados politicamente no Departamento de Justiça durante o governo Bush.
Obama disse desconhecer a proposta de Leahy, embora não a descartasse explicitamente.

A comissão é uma das várias idéias dos que pretendem revisar o passado, limpar o sistema judicial e restaurar a reputação dos Estados Unidos no mundo.

Leahy disse que o objetivo principal da comissão será conhecer a verdade, mais do que julgar ex-funcionários, mas acrescentou que a investigação deveria ir muito além dos crimes no Departamento de Justiça, para incluir a inteligência antes da guerra do Iraque e ações do Departamento da Defesa.
Tal comissão, como a sul-africana, teria poder para intimar testemunhas e acusados, mas não para determinar condenações, explicou.

Esta equipe investigaria a demissão de promotores norte-americanos que resistiam em aceitar ordens que consideravam ilegais, maus-tratos e torturas contra suspeitos de terrorismo a autorização de escutas telefônicas sem ordem judicial, segundo Leahy.
O senador disse que se poderia conceder às testemunhas imunidade judicial limitada para facilitar seu depoimento.
Outros democratas exigiram o processo penal contra os que autorizaram mecanismos questionados na guerra contra o terrorismo.

Os republicanos responderam que as decisões adotadas após os atentados de 11 de setembro de 2001 não devem ser questionadas a posteriori.
Medida possivelmente mais forte foi proposta pelo presidente do Comitê Judicial da Câmara de Representantes, o democrata John Conyers, e outros nove legisladores. O projeto implicaria a criação de Comissão Nacional sobre Poderes Presidenciais de Guerra e Liberdades Civis, com poder de intimar testemunhas e orçamento de aproximadamente US$ 3 milhões.

Essa comissão investigaria assuntos que vão de maus-tratos a presos até uso de métodos de tortura como o submarino, passando pelas “entregas extraordinárias” clandestinas de prisioneiros a países conhecidos por violarem os direitos humanos. Os membros dessa equipe viriam de fora do governo e seriam designados pelo presidente e por líderes parlamentares dos dois partidos.
Seria organismo semelhante à Comissão 9/11, criada para examinar o fracasso do governo em prever os atentados de 2001.
A investigação dessa comissão não levou ao julgamento de nenhum funcionário.
Organizações de direitos humanos e advogados propõem iniciativas mais contundentes.
A Anistia Internacional lançou campanha de pressão sobre os legisladores para que investiguem os abusos do governo dos Estados Unidos na guerra contra o terrorismo e levem os responsáveis a julgamento.
A organização pede a Obama e ao Congresso que criem comissão independente e imparcial para examinar o uso das torturas, as detenções indefinidas, as entregas extraordinárias e outras políticas antiterroristas ilegais.
A Anistia não vê contradições entre o órgão com a Comissão 9/11 e outro “de verdade e reconciliação”.
“Não creio que os dois enfoques sejam excludentes. Ambos podem avançar ao mesmo tempo. As imunidades não devem ser absolutas”, disse à IPS Tomparker, da Anistia.

Marjorie Cohn, presidente do Colégio Nacional de Advogados, rejeita a criação de comissão da verdade.
“Como disse o presidente Obama, ninguém está acima da lei. O promotor-geral deveria designar juiz especial que investigue e julgue funcionários do governo Bush e advogados que estabeleceram a política que propiciou crimes de guerra’, disse Cohn à IPS.
“As comissões de verdade e reconciliação são usadas por democracias nascentes ou em transição. Dar imunidade a testemunhas assegura que os responsáveis por torturas e abusos e as escutas ilegais nunca serão levados perante a justiça”, acrescentou.

“As imunidades poderiam comprometer julgamento penal, como demonstra a experiência do caso Irã-Contras”, afirmou à IPS Peter M. Shane, professor de direito da Universidade Estatal de Ohio.
“As democracias dependem de uma impassível compreensão do passado”.
Comissão da verdade para investigar poderosos funcionários constituiria “leviandade judicial” diante do rigoroso julgamento de “acusados por tráfico de drogas e crimes não violentos jogados promiscuamente em prisões superlotadas”, disse à IPS Brian J. Foley, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Boston.

O constitucionalista David Cole, da Universidade de Georgetown, acredita que o governo Obama ou o Congresso “deveriam, no mínimo, designar comissão independente, bipartidária e seleta, para investigar e determinar responsabilidades pela adoção de políticas coercitivas de interrogatórios dos Estados Unidos”.
Esta divergência de pontos de vista coloca Obama em posição incômoda.

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