Bloqueio a Cuba e a podridão humana na Casa Branca

a degradação moral combina com a estupidez do grupo que está prestes a deixar o governo dos EUA e que atolou o país em pântanos dos quais não sairá incólume: Afeganistão, Iraque, Oriente Médio e crise financeira

Atilio Boron
Sociólogo, secretário executivo do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (Clacso) e professor de Teoria Política na Universidade de Buenos Aires
Original em espanhol: http://alainet.org/active/27183

Traduzido por João Camargo

Enumerar todas as atrocidades cometidas nos últimos tempos contra os povos e contra o meio ambiente para salvaguardar o sistema capitalista dos EUA ocuparia demasiado espaço.
Gostaríamos de deter-nos em notícia de grande atualidade: há poucos dias, vésperas das eleições presidenciais que escolheram Barat Obama presidente do Estados Unidos, aconteceu votação, na Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU), pela qual 185 dos 192 países membros aprovaram, pela 17ª vez consecutiva, resolução exigindo o fim ao bloqueio iniciado há 46 anos contra Cuba.

Em 17 oportunidades, Washington ignorou despreocupadamente as recomendações – praticamente unânimes – da comunidade internacional, no entanto, tem o descaramento de arrogar-se a missão de espalhar a justiça e a liberdade pelo planeta.
Não se conhece antecedentes de repúdio tão geral das políticas do império norte-americano, acompanhado na defesa das suas vilanias somente por Israel (seu estado cliente e polícia no Médio Oriente) e Palau.
Merece adendo o caso de Palau, este micro-estado que, segundo informa o serviço de informação dos EUA, CIA, é conjunto de pequenas ilhas de 451 km2 com população de 21.093 habitantes.

É país "independente", que vota na ONU e se alinha com a Casa Branca, razão pela qual é caracterizado pelos publicitários dos governos dos EUA como "sólida e vibrante democracia".
Palau tem partido único, mas isto não preocupa Washington, que no entanto critica Cuba.
Palau não provoca à inefável Condoleezza Rice como as débeis arquiteturas institucionais dos sistemas políticos da Venezuela e da Bolívia.
Também o fato de na Arábia Saudita, grande amigo de Washington, os partidos políticos estarem proibidos, não tira o sono dos ocupantes da Casa Branca.

De qualquer modo, estes são detalhes que, no caso de Palau, compensam-se amplamente quando se sabe que esse protetorado do Tio Sam assinou Tratado de Livre Associação com os Estados Unidos que o converte de fato em colônia, embora de tipo muito especial, porque senta-se na Assembléia Geral para votar a favor dos seus amos e opinar e propor resoluções sobre assuntos de interesse mundial.

Porto Rico não teve a mesma sorte, já que Washington preocupou-se desde a fundação da ONU em incluir esse despojo de guerra na lista dos Territórios Não Autônomos e, como tal, não habilitado a integrar a ONU.

Os seus quatro milhões de habitantes e mais outros tantos que residem nos Estados Unidos, não podem opinar sobre qualquer assuntos. os de Palau sim.

Felizmente nesta última Assembléia da ONU, as Ilhas Marshall, que a própria CIA descreve como simples "testing ground" (campo de testes) dos mísseis do Pentágono – algo que até há pouco tempo também se fazia na ilha porto-riquenha de Vieques – e a Micronésia decidiram desobedecer às ordens da Casa Branca e abstiveram-se de votar contra Cuba.

A Casa Branca está putrefada moralmente; não há outra forma de qualificar a pertinaz manutenção de bloqueio de quase meio século – caso único na história da humanidade! – que é na realidade prolongado castigo aplicado a Cuba por ter-se atrevido a lutar pela sua verdadeira independência.

Castigo exemplar, desses que os escravagistas, que se autodenominavam "conquistadores", de Espanha e Portugal aplicavam com total sadismo aos que tinham a ousadia de pretender libertar-se das suas correntes.

Outras potências coloniais não ficaram atrás neste torneio de infâmias e humilhações.

A França, sem ir mais longe, impôs à jóia das suas colônias no Caribe, o Haiti, em 1825, o pagamento de enorme indenização (equivalente a uns US$ 21 bilhões hoje) pelos "prejuízos" provocados aos latifundiários franceses pela sua independência.

Os colonialistas franceses, vergonhosa e de forma humilhante, após prévio envio de frota de navios de guerra, impuseram tributo de 50% de todos os bens que entrassem ou saíssem desse desafortunado do Haiti; resultado, o país só conseguiu acabar de pagar em 1947.
Depois de mais de um século de saque "legalizado" e sancionado pelos campeões mundiais da liberdade, da democracia e da justiça, aquela que fora uma das ilhas mais ricas do Caribe caiu afundada na miséria mais absoluta, o que perdura até hoje. Mas Cuba não pode ser igualmente vergada, e isto os imperialistas não perdoam; para eles, Cuba é péssimo exemplo que se deve erradicar da face da Terra.
Aí estão a Venezuela, a Bolívia e o Equador para demonstrar a malignidade do contágio.

E os outros governos, que sem terem sido infectados com o vírus da autodeterminação e dignidade nacional, flertam com os rebeldes.

Nem ainda a fenomenal devastação produzida por dois gigantescos furacões fez com que os EUA pusessem temporariamente entre parênteses a sua política criminosa a fim de honrar os valores humanistas e solidários sobre os quais, dizem eles, está assente a sociedade norte-americana.

Tal como declarara na ONU o ministro cubano dos Negócios Estrangeiros Pérez Roque, o saldo deste desastre foi de "mais de 500 mil habitações e milhares de escolas e instituições de saúde afetadas, um terço da área cultivada devastada e severa destruição da infra-estrutura elétrica e de comunicações, entre outros danos".
A reconstrução do país, empreendimento humanitário por definição, seria enormemente facilitada se a Casa Branca tivesse, apesar de tudo, pequeno resquício de nobreza e moralidade e houvesse permitido a Havana adquirir os bens que necessita nos Estados Unidos.
Mas é inútil: não tem.

A Revolução Cubana não quer prendas; quer comprar, pagando efetiva e adiantadamente as suas compras, o que favoreceria os empresários e trabalhadores desse país e ajudaria a revitalizar, ainda que em pequena escala, economia que já se despenca na direção da recessão.

Mas nem isso a Casa Branca admite.

Daí que seja lógico falar da podridão moral que envolve os seus ocupantes.
Administração que já demonstrou a sua total insensibilidade e colossal inaptidão (além de dissimulado racismo) perante o flagelo que o Katrina provocou entre os seus em Nova Orleãs.
Degradação moral que, para colmatar, combina-se com a inaudita estupidez da gangue reacionária que por estes dias manda em Washington e que acelerou o enterro do país em toda a espécie de pântanos dos quais não sairá incólume: Afeganistão, Iraque, Oriente
Médio e, agora, o rebentamento da fenomenal bolha financeira alimentada por essa gente ao longo de muitos anos.
Deste modo, Cuba deverá adquirir em terras afastadas bens que, devido ao bloqueio e ao transporte, acabarão por sair caríssimos.
Será muito mais difícil, mas a Revolução Cubana já deu repetidas mostras de não acovardar-se perante a adversidade nem ser vencida por ela. Agora terá a oportunidade de demonstrá-lo uma vez mais.
E para isso contará com a solidariedade do mundo inteiro, exceto esse trio desprezável de rufiões que votou contra si na ONU.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Buscar neste site: