Todo Estado com armas nucleares é por definição terrorista

EUA querem mísseis na Europa para estar em condições de fazer e ganhar guerra nuclear
Jan Oberg
Diretor e co-fundador da Transnational Foundation (FTT), com sede em Lund, na Suécia; pesquisador em conflitos e temas da paz
Inter Press Service

Vivemos em época na qual a informação confusa e deliberadamente distorcida ameaça substituir o conhecimento.
Por exemplo, políticos, jornalistas e inclusive esquerdistas e pacifistas falam sobre a Defesa contra Mísseis Balísticos (DMB) que os Estados Unidos querem instalar na Polônia e na República Checa como se realmente se tratasse de um dispositivo de defesa.

Não é.

O pretexto para instalar este sistema, ao qual a Rússia se opõe por sentir-se ameaçada, é a possibilidade de ataques com mísseis por parte do Irã.

Mas isso é só pretexto, porque a verdadeira razão para a instalação da DMB é o desejo perverso do Estados Unidos de estar em condições de fazer e ganhar guerra nuclear.

Tal como está formulada na Teoria do Uso Nuclear (TUN) adotada por Washington, a DMB constitui ruptura fundamental com a lógica da dissuasão nuclear, ou a Destruição Mutuamente Assegurada (DMA), que o mundo viveu desde 1945.
Indubitavelmente provocativa, a filosofia da DMA e da TUN é a seguinte: Imaginem duas potências nucleares, A e B, se enfrentando.
Cada uma tem seu arsenal de armas nucleares distribuídos em silos instalados em terra, aviões e submarinos, a chamada tríade.
Suponham que A lance primeiro golpe nuclear. Como não pode estar certo de destruir todo armamento nuclear de B embora tenha usado muitas das suas armas, assume o risco calculado de que B seja capaz de responder com ataque que poderia matar milhões de cidadãos de A e destruir seus centros de comando.
O suposto psico-político e filosófico que dava sustentação à DMA é o seguinte: a será dissuadido de começar guerra nuclear porque sem dúvida provocará represália por parte de B e, em conseqüência, sofrerá baixas maciças.

De fato, o lançamento de uma única arma nuclear equivaleria a suicídio.
Neste ponto devem ser feitas três importantes observações.
Em primeiro lugar, a DMA foi construída sobre série de suposições sobre a psicologia humana, a existência e as capacidades técnicas que são altamente discutíveis em cuja validade poderia ser comprovada somente no caso de guerra nuclear.

Em segundo lugar, a DMA equivale a forma de terror no mais claro sentido da palavra, já que toma pessoas inocentes como reféns e as mata.
Em terceiro lugar, depois do 11 de setembro de 2001 ninguém usa a palavra terror para se referir às armas nucleares apesar do fato de elas tornarem pequenas as ameaças, supostas ou reais, do atual “terrorismo”.
Cada Estado que tenha armas nucleares é, por definição, um Estado terrorista.
Se houvesse verdadeira guerra contra o terror, a abolição das armas nucleares seria a prioridade.
A DMB representa ruptura fundamental com a dissuasão porque tem como objetivo prevenir que B tome represálias contra o povo e o território de A.

Se A tem a capacidade tanto para destruir B quanto para desbaratar sua represália, A pode supor que tem condições de desencadear e ganhar guerra nuclear sem nenhum dano para si próprio, o que diminuir sensivelmente o limite da dissuasão.
Além disso, A pode inclusive ver-se estimulado a lançar primeiro golpe e destruir preventivamente a outra parte porque o custo para sim próprio aparece menor do que sob as suposições da DMA.
A DMB poderia, provavelmente, estimular nova corrida armamentista.

B e outras potências nucleares secundárias tratariam de aumentar seus arsenais nucleares para garantir que pelo menos algumas conseguissem atravessar o escudo defensivo de A em seus esforços para responder ao primeiro ataque de A.

A, neste cenário hipotético é, naturalmente, os Estados Unidos, único país na história que conta com teoria como TUN, que desenvolve a tecnologia para ela e que formula doutrina oficial sobre o uso de armas nucleares inclusive contra países não-nucleares.

Se os Estados Unidos alguma vez colocar em prática sua política terrorista o resultado será pior do que o que milhares de Bin Laden poderiam causar. Se trataria de mega-terrorismo.

Numerosos cidadãos e governos estão protestando pela DMB, com Rússia, Polônia e República Checa em particular.

A Groenlândia é parte do plano, mas seus habitantes não foram informados disso.

O Japão também, mas se trata de um caso diferente, pois não é Estado soberano no que se refere à sua política externa.
Estes protestos públicos ocorrem apesar de a maioria dos meios de comunicação, com conhecimento ou não, apoiarem a postura ofensiva e a crueldade do complexo militar-industrial-mediático-acadêmico, que quer evitar o muito necessário debate crítico sobre a DMB.
O principal problema da humanidade não é a proliferação nuclear e, portanto, não é o Iraque nem o Irã.

O verdadeiro problema é a própria existência de armas nucleares.

O que diz realmente o vinculante Tratado de Não-proliferação Nuclear é que a proliferação a países não-nucleares deve deter-se como contrapartida pela abolição dos arsenais nucleares das potências nucleares.

Estados Unidos, Rússia, França, China, Israel, Paquistão, Índia e Reino Unido são o problema, não o Irã nem o Iraque, nem a Coréia do Norte.

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