Interesses externos sobre o petróleo brasileiro

Fernando Siqueira, da Aepet
Quarta Frota dos EUA preocupa Lula; engenheiros da Petrobras querem mudar Lei do Petróleo

Enquanto o Brasil caminha a pleno vapor com novas descobertas de reservas de petróleo, sente-se a ação cada vez mais pesada de interesses externos sobre a riqueza do País.

A decisão dos Estados Unidos de reativaram a Quarta Frota, com navios de guerra e aviões para patrulhar o Atlântico Sul, por exemplo, preocupa o governo brasileiro; a frota, criada na Segunda Guerra para enfrentar ameaças de submarinos alemães contra navios norte-americanos na região, estava desativada desde 1950.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva solicitou ao ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, que peça explicações à secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, a respeito da frota e do interesse norte-americano em patrulhar o Atlãntico Sul.
"Descobrimos petróleo em toda a costa marítima brasileira, a 300 km da costa, e queremos que os EUA expliquem qual a lógica dessa Quarta Frota, se vivemos em em região totalmente pacífica. Nossa única guerra é contra a pobreza e a fome. Se fosse frota de navios de alimentos ou de sementes de alimento, seria até razoável", disse Lula.
"Temos certeza que o ministro Amorim saberá obter resposta da Condoleezza", acrescentou o presidente, em tom amistoso.
Outro tipo de ação dos interesses externos sobre a riqueza petrolífera do Brasil ocorre no âmbito doméstico: multinacionais poderosas – Halliburton, Exxon, Repsol – contam com apoio de influentes lideranças empresariais e políticas do País, que, beneficiando-se do prodigioso espaço concedido pela mídia corporativa, afirmam não serem as recentes descobertas brasileiras de petróleo frutos exclusivos de 50 anos de trabalho da Petrobrás.
De acordo com as petrolíferas, as descobertas recentes teriam sido resultado da Lei do Petróleo, que estabeleceu o fim do monopólio da União na exploração do combustível e aumentou o número de empresas atuando no país.
A economista Valéria Nader, do jornal Correio da Cidadania, entrevistou Fernando Siqueira, da Associação de Engenheiros da Petrobras (Aepet) sobre as benesses que essa concepção recebe e que encontra muitas vezes escandalosa guarida em preocupante interseção entre interesses privados e públicos.

"A Aepet, tendo em vista mais esta indicação de apropriação indébita de recursos brasileiros, já está propondo mudanças na Lei do Petróleo, em carta enviada ao Congresso!, afirmou Siqueira.
Segundo Siqueira, a mudança na lei apresenta três justificativas importantes:
1) necessidade urgente de eliminar incoerências da Lei do Petróleo: os artigos 3º e 21º determinam que as jazidas e o produto da exploração delas pertencem à União, consoantes com a Constituição Federal, mas o artigo 26 diz que quem produzir o petróleo é dono dele; este artigo foi fruto do lobby das petrolíferas sobre o Congresso Nacional;

2) a lei estabelece que a União terá Participação Especial na produção pelas concessionárias, mas o Decreto 2705, de 1998, estabelece esta participação em patamar absurdamente baixo.
Para águas profundas, a participação varia de 0 a 40%; no mundo, os países exportadores recebem, em média, 84% a título de Participação Especial;
3) A justificativa para a mudança da Constituição era a vinda de capital externo para descobrir novas áreas produtoras; o pré-sal não tem mais o que descobrir; já está descoberto e a quantidade de petróleo é enorme, sem nenhum risco.
Siqueira afirma que o Brasil não pode abrir mão de riqueza desta ordem tendo 60 milhões de miseráveis, sistema de saúde caótico, educação vergonhosa, infra-estrutura e desenvolvimento muito aquém do seu potencial.

"Mesmo tendo parlamento vergonhoso, ainda assim, acho que a sociedade tem que exigir os seus direitos e defender o patrimônio nacional.
E aqui dou algumas razões: suponhamos, para efeito de raciocínio, que as reservas do pré-sal sejam da ordem de 100 bilhões de barris e que o petróleo mantenha-se no preço de US$ 140/barril (sabemos que a tendência de subida é irreversível, visto que chegamos ao pico de oferta). Suponhamos, para efeito de cálculo, que chegue a 100 bilhões de barris de reserva, a 140 dólares o barril, isto representa riqueza de US$ 14 trilhões, que pertence ao povo brasileiro", diz Siqueira.
Aos que dizem que as descobertas de petróleo, denominada pré-sal, não foram frutos exclusivos da Petrobras e, sim, de empresas atuando no país, Siqueira responde que a Petrobrás estudou essa província durante 30 anos, correu todos os riscos para encontrá-la, sendo que o primeiro poço custou US$ 240 milhões.

Siqueira explica que a estatal desenvolveu toda a tecnologia para explorar nessa profundidade; as empresas estrangeiras que vieram não adquiriram um único bloco em áreas novas.

"As multinacionais só compraram blocos onde a Petrobrás pesquisou e eliminou boa parte do risco geológico. No caso do pré-sal é ainda mais gritante: as empresas não tinham conhecimento tecnológico nem confiança ou coragem de participarem sozinhas e se associaram à Petrobrás. Mas não ajudaram em nada. A Petrogal, por exemplo, não conhece águas profundas; nem a Repsol, mas ambas agora são sócias em decobertas", assinala ele.

A maior revolta de Siqueira é contra a Halliburton, cujo presidente foi, por muito tempo, o atual vice-presidente norte-americano, Dick Cheney, eminência parda de Bush e chefe, na Casa Branca, do lobby das petrolíferas e da indústria de armamentos pesados.

"A Halliburton", diz Siqueira, "é caso de polícia internacional. Além de ter trazido o seu diretor (Nelson Narciso) de Angola para trabalhar na Agência Nacional de Petróleo (ANP), a multinacional administra, há 10 anos, o banco de dados daquela agência reguladora; ou seja, controla os dados de exploração que a Petrobrás é obrigada, pelo artigo 22 da Lei 9478/97, a repassar à ANP. A Halliburton tem mega-contrato de serviços com a Petrobrás há vários anos, para perfilagem e canhoneio de poços. É relação que precisa ser revista".
Siqueira lembra que o mundo está em pleno terceiro e definitivo choque de petróleo (com a oferta chegando ao pico e a demanda crescendo fortemente), cuja conseqüência é a subida, irreversível, do preço do barril de petróleo.
"Como os EUA têm brutal dependência do petróleo (consomem 10 bilhões de barris/ano, dos quais 8 bilhões internamente e 2 bilhões nas bases militares, tendo 29 bilhões em reservas), o país deve vir com todo o aparato político/econômico e militar atrás de nossas reservas. A Halliburton, como ponta de lança, e as demais empresas norte-americanas estarão à frente desse processo com todos os seus recursos escusos de pressões e constrangimentos", adverte Siqueira.

O técnico da Petrobras denuncia mais: a Repsol vem fazendo lobby fortíssimo pela reabertura dos leilões e a permanência do marco regulatório.
"A Respsol é empresa do Banco Santander, cujo dono é o Scotland National Bank Co., ou seja, é o capital anglo-americano, o mesmo que coordenou a invasão do Iraque; é presidida pelo também presidente do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), o lobbista João Carlos de Luca. Todos são membro da poderosa comunidade financeira internacional anglo-americana", alerta Siqueira.

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